Pata-Seca O “Escravo Reprodutor”
Roque José Florêncio: O Escravo que Viveu 130 Anos e Teve 200 Filhos
No coração do Brasil, em meio aos campos verdejantes do interior de São Paulo, emerge a história de um homem que desafiou as amarras da escravidão e se tornou um símbolo de resistência e legado. Roque José Florêncio, conhecido como Pata-Seca, viveu 130 anos e teve 200 filhos, sua história ecoa através do tempo, revelando os horrores da escravidão, a força do espírito humano e a complexa teia de relações que moldaram a sociedade brasileira.
A Chegada de Pata-Seca à Fazenda
Nascido na primeira metade do século XIX, Roque José Florêncio foi comprado pelo latifundiário Francisco da Cunha Bueno em uma feira na então vila de Sorocaba. Sua estatura de 2,18 metros e suas mãos longas e finas lhe renderam o apelido de Pata-Seca.
O “Escravo Reprodutor”
Naquela época, corria o mito de que homens altos de canelas finas seriam mais propensos a gerar filhos homens, uma superstição lucrativa nos longos e cruéis anos da escravidão no Brasil. Com suas características físicas notáveis, Florêncio foi designado “escravo reprodutor”, sendo obrigado a visitar a senzala regularmente para estuprar as mulheres e gerar filhos para o trabalho escravo.
Pata-Seca: Mensageiro e Pai de Família
Pata-Seca não trabalhava na lavoura nem vivia na senzala. Tinha boas relações com seu proprietário e era responsável por percorrer todos os dias, a cavalo, os 35 quilômetros que separam o vilarejo rural de Santa Eudóxia da cidade de São Carlos para buscar a correspondência, além de cuidar dos demais animais de transporte da fazenda.
Foi no serviço de mensageiro que conheceu Palmira, moça da cidade que pediu em casamento, colocou na garupa do animal e levou para o sítio. Os recém-casados ganharam do dono da fazenda 20 alqueires de terra, em que construíram uma casa e tiveram nove filhos.
Legado e Memória
Estima-se que 30% da população do distrito de Santa Eudóxia, hoje, seja descendente de Pata-Seca, que teria cerca de 200 filhos não registrados. Sua história, contada por sua neta Maria Madalena Florêncio Florentino, é um testemunho da força do espírito humano e da capacidade de resistência em face da adversidade.
A Importância de Resgatar a Memória Negra
O psicólogo Marinaldo Fernando de Souza, doutor em educação pela Universidade Estadual Paulista (UNESP), afirma que “a história oficial tende a forçar o esquecimento da memória negra”. Para o pesquisador, a presença de Florêncio pode explicar como o número de escravos da região continuou subindo mesmo após a promulgação da Lei Eusébio de Queirós, que impediu o tráfico de escravos da África pelo Atlântico em 1850.
“Se fosse um branco, não seria lenda. Ele é real, foi escravizado”, comentou o pesquisador. “Essa história precisa ser resgatada e não precisa de documentos. Os documentos são forjados em prol da elite branca. A memória negra precisa vir à tona”.
Conclusão
A história de Roque José Florêncio, o escravo que viveu 130 anos e teve 200 filhos, é um capítulo importante da história do Brasil. Sua vida nos convida a refletir sobre os horrores da escravidão, a importância da memória e a força do espírito humano. Ao conhecer sua história, honramos sua memória e contribuímos para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.